segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Para lembrar

"Para o homem que morre de fome não existe a forma humana da comida, mas apenas seu modo de existência abstrato de comida; esta bem poderia apresentar-se na sua forma mais grosseira, e seria impossível dizer então em que se distingue esta atividade para alimentar-se da atividade animal para alimentar-se. O homem necessitado, carregado de preocupações, não tem senso para o mais belo espetáculo. O comerciante de mineirais não vê senão seu valor comercial, e não sua beleza ou a natureza peculiar do mineral; não tem senso mineralógico. A objetivação da essência humana, tanto no aspecto teórico como no aspecto prático, é, pois, necessária, tanto para tornar humano o sentido do homem, como para criar o sentido humano correspondente à riqueza plena da essência humana e natural." (MARX, 1987, p. 178).

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Intimidade

No coração da mina mais secreta,
No interior do fruto mais distante,
Na vibração da nota mais discreta,
No búzio mais convolto e ressoante,

Na camada mais densa da pintura,
Na veia que no corpo mais nos sonde,
Na palavra que diga mais brandura,
Na raiz que mais desce, mais esconde,

No silêncio mais fundo desta pausa,
Em que a vida se fez perenidade,
Procuro a tua mão, decifro a causa
De querer e não crer, final, intimidade.

José Saramago

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

(...) se antes de cada acto nosso nos puséssemos a prever todas as consequências dele, a pensar nelas a sério, primeiro as imediatas, depois as prováveis, depois as possíveis, depois as imagináveis, não chegaríamos sequer a mover-nos de onde o primeiro pensamento nos tivesse feito parar.

Ensaio sobre a cegueira, José Saramago

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Cada estação da vida é uma edição, que corrige a anterior, e que será corrigida também, até a edição definitiva, que o editor dá de graça aos vermes.

Machado de Assis

domingo, 23 de setembro de 2007

Last Broadcast

I was thinking about what you said
I was thinking about shame
The funny thing you said
'Cause it's better not to stay
Sure enough if you feel nothing
You're better off this way
Gets to the point where you can't breathe
It's the last word
I can see where it stands

So here we are
At the last broadcast
Here we are
Our last broadcast

Sun on faces made us feel alive
The colours of the sky
Southern trees, made us enemies
Who knows the reason why?
You can't escape yourself
You can't just fall away
It comes to the point when you feel nothing
This is the last time
'Cause I can see it in your eyes

So here we are
At the last broadcast
Here we are
Our last broadcast

This is
The last broadcast
Here we are
Our last broadcast

Doves
Álbum: The Last Broadcast (2002)

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Cansei-me de tentar o teu segredo:
No teu olhar sem cor, - frio escalpelo, -
O meu olhar quebrei, a debatê-lo,
Como a onda na costa dum rochedo.

Segredo dessa alma e meu degredo
E minha obsessão! Para bebê-lo
Fui teu lábio oscular, num pesadelo,
Por noites de pavor, cheio de medo.

E o meu ósculo ardente, alucinado,
Esfriou sobre o mármore correto
Desse entreaberto lábio gelado...

Desse lábio de mármore, discreto,
Severo como um túmulo fechado,
Sereno como um pélago quieto.

Camilo Pessanha

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Tão cedo passa tudo quanto passa!
Morre tão jovem ante os deuses quanto
Morre! Tudo é tão pouco!
Nada se sabe, tudo se imagina.
Cincunda-te de rosas, ama, bebe
E cala. O mais é nada.

Fernando Pessoa